sábado, 12 de novembro de 2016

Lima Barreto será o autor homenageado na Flip em 2017

RIO - Um escritor negro, de origem humilde, que passou por duas internações no hospício e sempre se manteve à margem da cena literária. Afonso Henriques de Lima Barreto será o autor homenageado da 15ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que vai acontecer entre os dias 26 e 30 de julho de 2017. A escolha vai de encontro às críticas recebidas pela festa na edição deste ano, principalmente a ausência de negros na programação principal.

Homenagear Lima Barreto era um desejo antigo de Joselia Aguiar, que assumiu a curadoria do evento no início do mês passado. Em 2013, a jornalista lançou uma campanha para que o escritor fosse homenageado na Flip do ano seguinte, mas a organização optou por Millôr Fernandes.

— Há um conjunto de nomes que são sempre lembrados, mas eu estava pessoalmente muito envolvida com o Lima. Uma sorte que todos toparam — diz Joselia.

A curadora reconhece que há uma reivindicação grande pela ampliação da presença de negros e mulheres nos eventos literários. Ela destaca que poucos autores negros alcançaram visibilidade depois de Lima Barreto e essas são questões que a interessam.

— Eu venho da Bahia, onde o movimento negro e o debate do racismo é muito presente. Já a questão da autoria feminina me interessa primeiro porque sou mulher. Isso é estimulante. Todo essa debate de minorias tem a ver com o próprio Lima — afirma ela.

Joselia lembra que a biografia do autor é marcada por acidentes. Filho de pai tipógrafo e mãe professora, ele garantiu a mesma educação da elite da época graças ao apadrinhamento do Visconde de Ouro Preto, ministro do Império. Após concluir o curso secundário no Colégio Pedro II, Lima ingressou na Escola Politécnica em 1897, mas nunca terminou o curso de Engenharia. Reprovado várias vezes, o escritor foi obrigado a trabalhar para sustentar os irmãos, devido a problemas psiquiátricos do pai. Em 1903, ele consegue um cargo no Ministério da Guerra e começa a colaborar com crônicas e artigos para diversos jornais. Seu primeiro romance, “Recordações do escrivão Isaías Caminha”, foi lançado em 1909.

MORTE PREMATURA

Dois anos depois, Lima Barreto publica, em formato de folhetim, o romance “Triste fim de Policarpo Quaresma”. Sua obra mais célebre só sairia em livro em 1915, após sua primeira internação no hospício. O autor morreu jovem, aos 41 anos, a poucas semanas do início da Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo. Essa trajetória conturbada abre diversas possibilidades para a curadoria, avalia Joselia.

— Lima é um personagem rico, capaz de suscitar muitos debates sobre o preconceito, a política. Ele era muito crítico da sociedade brasileira e alguns pontos que ele observa, certas estruturas sociais, permanecem. Lima se sentiu atingido pelo preconceito. Ele achava que por isso não conseguia maior repercussão para a sua obra. Mas, para além de toda a riqueza da biografia dele, quero mostrar como ele é interessante como autor. Os livros dele devem ser mais lidos e ele reconhecido como o grande autor que é — diz a curadora.

Beatriz Resende, professora titular da Faculdade de Letras da UFRJ e especialista na obra do escritor, acredita que essa é a hora certa para a homenagem.

— É até bom que não tenha sido antes. Porque agora o país está fervendo com tantas discussões, é o melhor momento para Lima Barreto vir à tona — afirma Beatriz





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